quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Soletro lentamente...* - GRAÇA PIRES

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELA AUTORA

Soletro lentamente a palavra mastro
e no cesto da gávea pego nos binóculos
para anunciar terra à vista.
A única rota que procuro é a que leva
à ilha coberta de bosques.
Tenho o mapa do tesouro escondido no decote.
Por isso os marinheiros rondam, exasperados,
o meu corpo como se um mar violento os habitasse.

EM - ESPAÇO LIVRE COM BARCOS - GRAÇA PIRES - POÉTICA EDIÇÕES

terça-feira, 29 de setembro de 2015

XXVIII - VICTOR OLIVEIRA MATEUS

A rapariga encostara-se ao umbral escalavrado. Agarrava ostensivamente um dos ferros do toldo. Sorria-me. A Torre dos Clérigos? Onde está a Torre dos Clérigos, que ainda ontem estava lá em cima? A rua enchia-se de personagens: vozes, idiomas, vestimentas. A rapariga continuou a sorrir e disse-me não foi ontem, foi a semana passada. Ele misturou as noites, confundiu as ruas, respondes-lhe. A rapariga afaga-me o ombro e volta para as outras mesas. Tu insistes que confundo sempre os caminhos - ah, mas este não! Este é o corolário do breu, órbita desenfreada com a tua paz lá dentro, a tua voz sussurrada, a nitidez do teu corpo com vastas clareiras de branco ao de leve tatuadas.

EM - NEGRO MARFIM - VICTOR OLIVEIRA MATEUS - LABIRINTO

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Tatuagem - ALBERTO RIOGRANDE

Arde-me a pele quando te penso.
Queria partir liberto
e voar por aí
como quem corre
demoradamente o mundo
sem fraquejar
no teu desejo,
a cada instante na tua carne
na pressa dos teus passos.
Consigo ouvi-los esmagando o asfalto,
o ranger da escada
a pele ávida viajando pela rua,
ainda faltam
sete degraus.
Dispo-te com o olhar.
E espero-te. Com a ânsia do abutre núbio.

EM - OFÍCIO DOS PÁSSAROS - ALBERTO RIOGRANDE - LUA DE MARFIM

domingo, 27 de setembro de 2015

Nas ondas - MARIA ANTONIETA OLIVEIRA

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELA EDITORA

Quase invisíveis,
as ondas deslizam suavemente
uma a uma
e eu,
penso em ti.
Queria como elas
deslizar nos contornos do teu corpo,
beijar cada milímetro
como o grão de areia é beijado pela água que passa.
Queria ser o sol
e acariciar tua face macia
rolar meus lábios na nudez de ti
aquecer teu corpo com o calor do meu.
Queria ser o sal que dá sabor à água que corre
e salpicar teu ser com o sabor do amor.
Queria deslizar suavemente
na onda invisível
e chegar a ti.

EM - ENCONTRO-ME NAS PALAVRAS - MARIA ANTONIETA OLIVEIRA - TEMAS ORIGINAIS

sábado, 26 de setembro de 2015

Amigos - JOSÉ MANUEL MARTINS PEDRO

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELA EDITORA

Quem cativa um amigo
Conquista um grande tesouro
Compara-se ao puro ouro
Que é testado no fogo
Para revelar sua pureza

Oh! Que beleza é a vida
Quando um amigo se tem
O seu sorriso encoraja
E dá alento a quem não tem

A vida tem mais alegria
O sol mais brilho e calor
Se o amigo está connosco
Faz-nos fortes até na dor
Tornando mais leve o fardo

Se esse amigo nos vem
É com alegria que o espero
E mesmo sem avisares
Sinto alegria na véspera
De um bom amigo encontrar!

EM - ENTRE O FADO E O SAMBA - COLECTÂNEA - EDIÇÕES OZ

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Perdida no nós - MARIA JOSÉ LACERDA

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELA AUTORA

Perdida nos silêncios que me vestem
A pele...
De olhos fechados
Igualmente silenciosos
Divago pelos momentos
De nós
Perdida no nós.

Tu perdido
Aqui
Onde me passeio sem ti
Me vivo a mim
Calada, sem voz presente
Ausente
Me interrogo
Será que voltas?
Afinal voltas sempre.

Volta, não sejas ausente
Fazes-me falta, sempre

EM - ESCRITUS E RABISCUS - MARIA JOSÉ LACERDA - UNIVERSUS

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Repensando... - NATÁLIA CANAIS NUNO

Sol aponta-me o caminho
sempre que nasce novo dia
mas anda a morte tão pertinho
que já nem minha sombra se fia

repensar leva-me à lembrança
e a uma imperiosa necessidade
voltar sempre lá atrás à criança
suando na lembrança a saudade

é como se o tempo suspendesse
e suspensa ficasse a respiração
como se o tempo não perdesse
e eu o segurasse com minha mão

vive-se mais intensamente agora
assim penso, levo meus dias a fio
recordando o meu rio que chora
no interior do coração tão vazio

EM - A MELODIA DO TEMPO - NATÁLIA CANAIS NUNO - LUA DE MARFIM

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Autópsia de um poema - ANGELINA ANDRADE

Procuro o ventre de um poema
Desmembro cada palavra
Olho, estudo cada víscera das letras
E no ventre, não encontro nada!
Pássaro morto
Búzio mudo?
Processo de alquimia
Construção sem alicerces
Que nada me diz
Das coisas da poesia!
Pulsam ainda palavras
Veias ainda frementes
No canto do olho uma lágrima
Moléculas de sentimento!
Mas, apressado vem o crítico e assina
Sem um espelho na boca do poema
O auto do falecimento

EM - NAS ASAS DE SIMORGH - ANGELINA ANDRADE - TEMAS ORIGINAIS

terça-feira, 22 de setembro de 2015

Rios - GABRIELA PAIS

Como gosto de contemplar e ouvir
os rios no murmurejar de suas águas
pelas margens de plantas a florir
quando ciciam prazenteiros sem mágoas.

São aveludados timbres de violino
que se soltam e acarinham as pedras
num saltitar frenético, felino,
sob um tremeluzir do Sol sem regras.

Rio de corredeiras ou quedas d'águas
ou mesmo sem elas, é chama viva
onde a cores, a pulcritude habita.

Buscas trilho do coração da tua diva
entre o belo azul e verde desaguas
no remanso das noites apaziguas.

EM - CASTELO DE LETRAS - GABRIELA PAIS - LUA DE MARFIM

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Ponte sem rio - TERESA TEIXEIRA

Sei que construíste uma ponte.
Para mim, amor...
Mas, e o rio, onde está?

O rio mudou-se,
Esqueceu-se do leito,
Dormiu ao relento,
Apagou-se...

E só tu não viste...

E mergulhaste, em vão,
Em pedras polidas,
Lambidas,
Pelo rio desertor,
Que já não é nosso, amor...

EM - DA SERENA IDADE DAS COISAS - TERESA TEIXEIRA - TEMAS ORIGINAIS

domingo, 20 de setembro de 2015

Beleza gasta - SARA TIMÓTEO

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELA EDITORA

Não há templos que a cubram
nem cristais ou jóias
que a favoreçam.

É uma mulher
de dentro da vida
e nada mais lhe resta
senão submeter-se ao vento
que abre caminho para a velhice
no seu rosto.

EM - ELIXIR VITAE - SARA TIMÓTEO - LUA DE MARFIM

sábado, 19 de setembro de 2015

218 - ÁLVARO DE CAMPOS

Ah! Ser indiferente!
É do alto do poder da sua indiferença
Que os chefes dos chefes dominam o mundo.

Ser alheio até a si mesmo!
É do alto do sentir desse alheamento
Que os mestres dos santos dominam o mundo.

Ser esquecido de que se existe!
É do alto do pensar desse esquecer
Que os deuses dos deuses dominam o mundo.

(Não ouvi o que dizias...
Ouvi só a música, e nem a essa ouvi...
Tocavas e falavas ao mesmo tempo?
Sim, creio que tocavas e falavas ao mesmo tempo...
Com quem?
Com alguém em quem tudo acabava no dormir do mundo...)

EM - POESIA - ÁLVARO DE CAMPOS - ASSÍRIO & ALVIM

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

O regresso do sorriso - JOÃO CARLOS ESTEVES

Findava-se um dia de paz
e serena aceitação
de novas etapas de vida

Sonolentamente olhei
e vi regressado
o sorriso
que me inundou a alma
no passado...

Sorri para esse sorriso,
saudoso do dia imortal
em que o vi nascer,
para permanecer
inevitavelmente gravado
nas memórias de uma vida
que se esfumou
em palavras vãs...

EM - GOTAS DE SILÊNCIO - JOÃO CARLOS ESTEVES - TEMAS ORIGINAIS

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Poema do burguês na praia - RUY BELO

Há mãos de mãe sobre a seara
que às três da tarde ondula no seu gesto
Já tudo tem um rosto
e o amor de que ele gasta resto

O mar faz-lhe lembrar um cego horizontal
de olhar embaciado

Veio de lisboa para o seu passado
está de acordo com tudo

EM - TODOS OS POEMAS VOL. I - RUY BELO - ASSÍRIO & ALVIM

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Rio seco - LITA LISBOA

Eu era o leito dum rio,
Tu, a água fresca que o inundava.
Mas trouxeste tanta pedra ao meu caminho,
Que senti um dia que o leito transbordava.
Agora o rio vai secando lentamente,
Com os ventos que levaram os meus ais.
As pedras ficaram sonolentas,
Já não as sinto, estão no meu silêncio,
Envoltas nas brumas do passado, que voltará jamais.
O meu leito acolhe agora as folhas do Outono,
Que sem mágoa me envolvem docemente
E me trazem o sorriso das brisas matinais.

EM - FRAGMENTOS DE MIM - LITA LISBOA - TEMAS ORIGINAIS

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Elogia barroco da bicicleta - ALEXANDRE O'NEILL

Redescubro, contigo, o pedalar eufórico
pelo caminho que a seu tempo se desdobra,
reolhando os beirais - eu que era um teórico
do ar livre - e revendo o passarame à obra.

Avivento, contigo, o coração, já lânguido
das quatro soníferas redondas almofadas
sobre as quais me entangui e bocejei, num trânsito
de corpos em corrida, mas de almas paradas.

Ó ágil e frágil bicicleta andarilha,
ó tubular engonço, ó vaca e andorinha,
ó menina travessa da escola fugida,
ó possuída brincadeira, ó querida filha,

dá-me as asas - trrrrim! trrrrim! - pra que eu possa traçar
no quotidiano asfalto um oito exemplar!

EM - POESIAS COMPLETAS - ALEXANDRE O'NEILL - ASSÍRIO & ALVIM

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Poema - LUCÍLIA GALHARDO

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELA EDITORA

Mergulho no teu olhar
Seguindo a tua voz quente,
Abraço os teus murmúrios,
Ouvindo a minha mente!

Conectando o meu coração
Soltam-se os sentimentos
Nascem flores em botão,
Os frutos que amanhã serão!

O papel é a tua tela,
A caneta o teu pincel,
As letras são as figuras
E as cores do teu "batel"

Alegria ou dor,
Desabafo do autor,
És espontâneo, és pensado,
És reflexo, és Fado!

És canção,
És música,
És Tema,
És Poema!

EM - AMANTES DA POESIA - ANTOLOGIA - UNIVERSUS

domingo, 13 de setembro de 2015

A trama do desejo - JOAQUIM VALE CRUZ

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELA EDITORA

Essa trama do desejo
pode terminar num beijo
por ser o maior dos anelos
nele nos prendemos tanto
que quase se torna em quebranto
que o leva ao enroscar-se em (a)pelos

E leva a loucura tanta
que nos aperta a garganta
em contracções desiguais
com sentimentos confusos
disseminados, difusos
mas sempre bons por demais

É uma atracção desmedida
que dá rumo à nossa vida
ou pode trazer desencanto
mas que é tão bom de sentir
pois que do amor pode vir
e sentir isso é um encanto...

EM - ENTRE O FADO E O SAMBA - COLECTÂNEA - EDIÇÕES OZ

sábado, 12 de setembro de 2015

O inconsciente - ANTERO DE QUENTAL

O espectro familiar que anda comigo,
Sem que pudesse ainda ver-lhe o rosto,
Que umas vezes encaro com desgosto
E outras muitas ansioso espreito e sigo,

É um espectro mudo, grave, antigo,
Que parece a conversas mal disposto...
Ante esse vulto, ascético e composto
Mil vezes abro a boca... e nada digo,

Só uma vez ousei interrogá-lo:
"Quem és (lhe perguntei com grande abalo)
Fantasma a quem odeio e a quem amo?"

- "Teus irmãos (respondeu) os vãos humanos,
Chamam-me Deus, há mais de dez mil anos...
Mas eu por mim não sei como me chamo..."

EM - SONETOS - ANTERO DE QUENTAL - ULMEIRO

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Mar é poesia - ALEXANDRE CARVALHO

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELO AUTOR

Azul, cinzento e verde-mar,
cor dos olhos meus,
violetas eram os olhos da tua mãe,
como olivas negras os olhos da minha mãe
castanhos de verde são os teus,
cabelos dourados emolduram teu sorriso,
juntos ao grisalho dos meus.
Ajudado pela Natureza mãe,
que me critiquem a escrita,
nunca quererei contra a natureza
cometer heresia
quero continuar por isso,
com destreza,
a escrever um mar de poesia.

EM - AGUARELA DE POESIA - ALEXANDRE CARVALHO - CHIADO EDITORA

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Quando penso... - JORGE DE SENA

Quando penso que há mais de trinta anos que publico poemas
e há trinta e seis que escrevo desta vida,
à minha volta há mais de mais vazios
de amigos mortos, poetas que estimei
(horror de folhear um livro de moradas)
ou quem mal conheci e às vezes via,
pergunto-me a mim mesmo se outros mais felizes
terão vazia a vida assim como eu.
Creio que não. A deles se reduz,
encolhe de miséria consentida,
e torna-se uma sala de visitas onde
recebem dia e noite os seus amigos novos.
Mas quem de liberdade e lealdade,
como de amor humano se viveu
fica num espaço cada vez mais vasto
onde os vivos que traíram e os mortos que morreram
tremem de ser lembrados com saudade ardente.
E o espaço fica - ah fica - e ninguém ousa
mais que espreitar a medo para dentro dele
pelas grades de um verso em que palpita a vida,
tão pura e tão ausente como quando um dia
primeiro ela vibrou num cheiro a maresia,
ascendendo das águas, luminosa,
num corpo ainda escamoso cuja pele
seria este saber de espaço e de ternura
em solidão perfeita descobrindo o amor.

EM - ANTOLOGIA POÉTICA VOL IV - JORGE DE SENA - GUIMARÃES

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

As férias - JOSÉ CARLOS ARY DOS SANTOS

Era uma rosa azul de água amarrada
um palácio de cheiros   um terraço
e uma jarra de amigos derramada
da casa até ao mar   como um abraço.

Era a intensa e clara madrugada
com cigarras dormindo no regaço
e a ampulheta do sono defraudada
no tempo cada dia mais escasso.

Era um país de urzes e lilases
de tardes sonolentas espreguiçando
um aroma de nardos pelo chão

e bandos de meninas e rapazes
correndo   amando   rindo e adiando
a minha inexorável solidão.

EM - OBRA POÉTICA - JOSÉ CARLOS ARY DOS SANTOS - EDIÇÕES AVANTE

terça-feira, 8 de setembro de 2015

Tu - TELMA ESTEVÃO

Vigias os meus sonhos
E roubas os meus suspiros,
Guardas os meus beijos
E sussurras as minhas palavras.

Partilhas das minhas carícias
E aspiras do meu fôlego,
Flutuas pelo meu corpo
E fundes-te na minha alma.

Vibras com a minha voz
E desejas do meu calor,
Meu coração encolhe,
Com medo de tanto amor.

EM - PALAVRAS - TELMA ESTEVÃO - LUA DE MARFIM

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Paraísos - ÂNGEL MAGALHÃES

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELA EDITORA

Paraíso onde as palavras fluem
através de uma música
paraíso onde as imagens se basculam
no pensamento
delírios que se definem
silenciosos e suspensos
abundância de cheiros
provocados pela epiderme
em exaltação,
súbitas pausas no versejar
para murmurar sonhos indolentes
desfolhar os espasmos
no seu fulgor mais saciado
servindo de ementa
de nossos corpos
secretos encontros
em forma de pecados
peregrinagem de gemidos
devorados pelas bocas sedentas.

EM - PECADOS - NAS ASAS DO DESEJO - ÂNGEL MAGALHÃES - EDIÇÕES OZ

domingo, 6 de setembro de 2015

Amizade - ALICE SANTOS

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELA AUTORA

Um recorte,
Um pedacinho de tecido,
Um emaranhado de linhas.
Lembram um campo florido,
As conversas das amigas.
São lágrimas e sorrisos,
São sérias ou divertidas,
São abraços e passeios,
Alegres entre amigas.
São mensagens, são visitas,
São tristezas consoladas,
São cusquices, curiosidades,
São lágrimas enxugadas,
Tudo entre amigas.
São carinhos, pura amizade,
É ternura e doçura,
É ralhar quando há necessidade,
É paz, é brandura.
São mil maravilhas,
Das coisas mais belas que a vida nos dá,
E esta nossa amizade,
Para sempre ficará.

EM - FRUTOS VERMELHOS - ALICE S - EDIÇÕES VIEIRA DA SILVA

sábado, 5 de setembro de 2015

Instantes sem ti - VERA SOUSA SILVA

Que fazer nos intervalos
de ti, do tempo que não se move
nem aquieta, como se
não houvesse mais nada,
como se tudo fosse negro
e saudade.

Como explicar o fogo
que ateaste em meu peito
e fazer dele lume e luz
dos dias que percorro
quando estás tão longe.

Como viver nos pequenos instantes
em que sais de dentro de mim.

EM - ATÉ AMANHÃ - VERA SOUSA SILVA - LUA DE MARFIM

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Inventei-te - ALVARO GIESTA

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELO AUTOR

Inventei-te
nas promessas flagrantes
do deserto
entre orvalhos inquietos,

lavrados
na intranquilidade
do meu inverno de silêncios-desejos

Na plenitude animal do meu interior
orvalhei o teu corpo
de sementes-promessas
como se carícias fossem

As mãos desbravaram
o fogo
e as trevas,
onde a água verte em desespero

Na passagem
da noite para a luz
infinita,
a esperança não se perde
na memória do passado;

antes,
digladia
e enfrenta o futuro

EM - UM ARBUSTO NO OLHAR - ALVARO GIESTA - CALÇADA DAS LETRAS

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Distância - ANTÓNIO GEDEÃO



Quantas vezes me perco e desespero
com doidas saudades que me assaltam
desses teus olhos que de amor se exaltam,
desses teus lábios por que tanto espero.

Sonhando, quantas vezes regenero,
as divinas carícias que me faltam.
Acordado, mais doces se ressaltam
porque mais compreendo que te quero.

Às vezes sinto em mim tão negro luto
que penso dar a vida para ter-te
junto ao meu peito apenas um minuto.

Pobre de mim, sem me lembrar que ao dar-te
a minha vida toda para ver-te,
ia ficar sem vida pr'adorar-te!

EM - OBRA COMPLETA - ANTÓNIO GEDEÃO - RELÓGIO D'ÁGUA

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Pinceladas da natureza - ANTÓNIO MR MARTINS



Quando cantam as aves
Melodias da liberdade
Logo ecoam nos campos
Vestígios de felicidade
Se encantam em seu redor
As árvores que as recebem
Num abraço de empatia
E na sua sombra as acolhem
Nesta troca que é pureza
Sem a procura de proveitos
São as riquezas da natureza
Com seus singelos defeitos

EM - FOZ SENTIDA - ANTÓNIO MR MARTINS - TEMAS ORIGINAIS

terça-feira, 1 de setembro de 2015

Nada que tive era meu - NATÉRCIA FREIRE



Nada que tive era meu.
Perdi estradas, perdi leito.
Na pedra onde me deito
Nada fala de alvos linhos.
Se, com cegos, me aventuro,
A caminhar rente aos muros,
É que meus olhos impuros
Sonham Cristo nos caminhos.

Nada que tive era meu
E o corpo não quero eu.
Podia servir de embalo,
Mas serve de sepultura.

Cemitério de asas finas,
Tange e plange aladas crinas,
Canto de praias sulinas
De infinitas amarguras...

EM - ANTOLOGIA POÉTICA - NATÉRCIA FREIRE - ASSÍRIO & ALVIM