Éramos adolescentes e nem notávamos
preocupados ainda em estar junto dos outros
o primeiro amor fazia-nos sofrer
como não supúnhamos possível
enchíamos os terraços de gambiarras
ou armávamos fogueiras enormes na praia
e dançávamos todo o verão
quase sem tempo para mais
por cima de todos os meses
a morte tomava tais proporções
EM - BALDIOS - JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA - ASSÍRIO & ALVIM
quinta-feira, 30 de junho de 2011
quarta-feira, 29 de junho de 2011
Seus passos... - ALBERTO DE LACERDA
Seus passos na nave interminável
Enaltecem os vitrais
Prolongam a luz coada
No mármore
EM - O PAJEM FORMIDÁVEL DOS INDÍCIOS - ALBERTO DE LACERDA - ASSÍRIO & ALVIM
Enaltecem os vitrais
Prolongam a luz coada
No mármore
EM - O PAJEM FORMIDÁVEL DOS INDÍCIOS - ALBERTO DE LACERDA - ASSÍRIO & ALVIM
terça-feira, 28 de junho de 2011
A literatura - JOSÉ ALBERTO OLIVEIRA
Cultivam-se virtudes raras: a bonomia,
o encanto, a mediocridade. Queimado
o acessório, que fica? O sal na água,
eis o espírito. E eis esse alferes que,
louco, enforcou os cães e o outro pequeno
oficial, que apaixonadamente conduziu
um pelotão à chacina. Ébrio, empunhando
o revólver até à morte. O cinismo
progredia. Ao fim de tudo,
uma bala perdida levou-lhe um olho.
Escreviam-se cartas à hora de almoço
e à hora do chá: o expatriado
e a florista. Essas pequenas vilas,
de escassa ribeira, onde é aprazível
deixar correr o tempo. A literatura.
EM - TENTATIVA E ERRO - JOSÉ ALBERTO OLIVEIRA - ASSÍRIO & ALVIM
o encanto, a mediocridade. Queimado
o acessório, que fica? O sal na água,
eis o espírito. E eis esse alferes que,
louco, enforcou os cães e o outro pequeno
oficial, que apaixonadamente conduziu
um pelotão à chacina. Ébrio, empunhando
o revólver até à morte. O cinismo
progredia. Ao fim de tudo,
uma bala perdida levou-lhe um olho.
Escreviam-se cartas à hora de almoço
e à hora do chá: o expatriado
e a florista. Essas pequenas vilas,
de escassa ribeira, onde é aprazível
deixar correr o tempo. A literatura.
EM - TENTATIVA E ERRO - JOSÉ ALBERTO OLIVEIRA - ASSÍRIO & ALVIM
segunda-feira, 27 de junho de 2011
Se não faleço... - JOÃO RUI DE SOUSA
Se não faleço faleço
ao meio dum deus e da lama
entre a rã e a estratosfera
entre um pássaro e o balanco
no circular desta chama
que sempre em luz me redime
e no sumir-se derrama
a água que escreve o pranto.
Com o torpor do relento
com chuvas de desencanto
nos algerozes da alma
correm gotas de tormento
corre o minaz duma lágrima
que só eu vejo - bem dentro.
EM - LAVRA E POUSIO - JOÃO RUI DE SOUSA - DOM QUIXOTE
ao meio dum deus e da lama
entre a rã e a estratosfera
entre um pássaro e o balanco
no circular desta chama
que sempre em luz me redime
e no sumir-se derrama
a água que escreve o pranto.
Com o torpor do relento
com chuvas de desencanto
nos algerozes da alma
correm gotas de tormento
corre o minaz duma lágrima
que só eu vejo - bem dentro.
EM - LAVRA E POUSIO - JOÃO RUI DE SOUSA - DOM QUIXOTE
domingo, 26 de junho de 2011
Dor - LITA LISBOA
Os flagelos são contidos em murmúrios...
A dor, em múltiplas resiliências...
Este Mundo está repleto de infortúnios...
E transbordando de incoerências!
Os desenganos não têm interrupção...
Em cada olhar há gritos lancinantes!
Até quando esta forma obscura de viver,
Que golpeia inexoravelmente o nosso ser?
EM - FRAGMENTOS DE MIM - LITA LISBOA - TEMAS ORIGINAIS
A dor, em múltiplas resiliências...
Este Mundo está repleto de infortúnios...
E transbordando de incoerências!
Os desenganos não têm interrupção...
Em cada olhar há gritos lancinantes!
Até quando esta forma obscura de viver,
Que golpeia inexoravelmente o nosso ser?
EM - FRAGMENTOS DE MIM - LITA LISBOA - TEMAS ORIGINAIS
sábado, 25 de junho de 2011
Arte poética - DOMINGOS DA MOTA
Um poema tomara: e que fosse
à raiz das raízes ou mais alto,
temporão ou serôdio: e se precoce
que andasse por aí em sobressalto
a abalar, a criar desassossego
mesmo á beira da fonte d'água pura,
desvelasse o mais íntimo do ego
e mostrasse o porquê da abrasadura
que ferra este pobre zé-ninguém
pois em busca de rumo perde o passo
(com a perna mais curta vai além
do que pode o seu pé e o seu braço):
um poema tomara eu fazer
que fosse ao coração do próprio ser.
EM - BOLSA DE VALORES E OUTROS POEMAS - DOMINGOS DA MOTA - TEMAS ORIGINAIS
à raiz das raízes ou mais alto,
temporão ou serôdio: e se precoce
que andasse por aí em sobressalto
a abalar, a criar desassossego
mesmo á beira da fonte d'água pura,
desvelasse o mais íntimo do ego
e mostrasse o porquê da abrasadura
que ferra este pobre zé-ninguém
pois em busca de rumo perde o passo
(com a perna mais curta vai além
do que pode o seu pé e o seu braço):
um poema tomara eu fazer
que fosse ao coração do próprio ser.
EM - BOLSA DE VALORES E OUTROS POEMAS - DOMINGOS DA MOTA - TEMAS ORIGINAIS
sexta-feira, 24 de junho de 2011
Difusa claridade - EDGARDO XAVIER
Uma luz doce desce
pelo teu ventre até à sombra
onde vibram os medos
e a boca mergulha como ave silenciosa
Carmim é a febre das sedas
no devassar dos segredos
e o corpo a voz sedenta
do infinito partilhado
EM - CORPO DE ABRIGO - EDGARDO XAVIER - TEMAS ORIGINAIS
pelo teu ventre até à sombra
onde vibram os medos
e a boca mergulha como ave silenciosa
Carmim é a febre das sedas
no devassar dos segredos
e o corpo a voz sedenta
do infinito partilhado
EM - CORPO DE ABRIGO - EDGARDO XAVIER - TEMAS ORIGINAIS
quinta-feira, 23 de junho de 2011
O que partiu de mim - NATÉRCIA FREIRE
Foi qualquer coisa que partiu de mim,
Num declínio de luz, de lentidão,
Como a hora em que a vida chega ao fim.
Partiu de mim a alma? O coração?
Um mundo de existências prolongadas,
Cansadas, bem sofridas, abafadas,
Partiu de mim, da minha reclusão.
EM - ANTOLOGIA POÉTICA - NATÉRCIA FREIRE - ASSÍRIO & ALVIM
Num declínio de luz, de lentidão,
Como a hora em que a vida chega ao fim.
Partiu de mim a alma? O coração?
Um mundo de existências prolongadas,
Cansadas, bem sofridas, abafadas,
Partiu de mim, da minha reclusão.
EM - ANTOLOGIA POÉTICA - NATÉRCIA FREIRE - ASSÍRIO & ALVIM
quarta-feira, 22 de junho de 2011
Eu - FLORBELA ESPANCA
Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem nome,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada... a dolorida...
Sombra de névoa ténue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...
Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...
Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver
E que nunca na vida me encontrou!
EM - SONETOS - FLORBELA ESPANCA - BERTRAND
Eu sou a que na vida não tem nome,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada... a dolorida...
Sombra de névoa ténue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...
Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...
Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver
E que nunca na vida me encontrou!
EM - SONETOS - FLORBELA ESPANCA - BERTRAND
terça-feira, 21 de junho de 2011
Para o além - DOMINGOS MONTEIRO
Pálida e linda, como um lírio doce
Partiste um dia, e eu nem sei sequer...
Talvez, talvez contigo também fosse
Esta minha alma em corpo de mulher.
Pálida e linda, como um lírio doce,
Olhos tristes, magoados de sofrer...
Ainda estou a ouvir a tua tosse
Dizer por ti, como quem 'stá a dizer:
Sou um lírio dorido do sol-posto,
E dum país de lenda este meu rosto,
Este corpinho, magro e delicado...
Eu vou partir; não chorem, avezinhas,
Como partem, sorrindo, as andorinhas,
Quando chega o Outono amargurado.
EM - POESIA - DOMINGOS MONTEIRO - INCM
Partiste um dia, e eu nem sei sequer...
Talvez, talvez contigo também fosse
Esta minha alma em corpo de mulher.
Pálida e linda, como um lírio doce,
Olhos tristes, magoados de sofrer...
Ainda estou a ouvir a tua tosse
Dizer por ti, como quem 'stá a dizer:
Sou um lírio dorido do sol-posto,
E dum país de lenda este meu rosto,
Este corpinho, magro e delicado...
Eu vou partir; não chorem, avezinhas,
Como partem, sorrindo, as andorinhas,
Quando chega o Outono amargurado.
EM - POESIA - DOMINGOS MONTEIRO - INCM
segunda-feira, 20 de junho de 2011
A voz solitária do homem - JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA
Há palavras que escrevemos mais depressa
o terror dessas palavras derruba
o passado dos homens
são tão pouco: vestígios, índices, poeira
mas nada lhe é desconhecido
as horas em que vigiamos o escuro
os sítios nenhuns das imagens
a ligeira mudança que resgataria
o abandono, todo o abandono
EM - BALDIOS - JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA - ASSÍRIO & ALVIM
domingo, 19 de junho de 2011
Desembarcarás... - ALBERTO DE LACERDA
Desembarcarás de um sol inonimato
de uma praia sem sombras
Perfil cada vez mais nítido
Para além das lágrimas
Que não sei deter
Olhar mútuo cada vez mais límpido
Depois de termos sobrevoado
Florestas virgens
Incomensuráveis
EM - O PAJEM FORMIDÁVEL DOS INDÍCIOS - ALBERTO DE LACERDA - ASSÍRIO & ALVIM
de uma praia sem sombras
Perfil cada vez mais nítido
Para além das lágrimas
Que não sei deter
Olhar mútuo cada vez mais límpido
Depois de termos sobrevoado
Florestas virgens
Incomensuráveis
EM - O PAJEM FORMIDÁVEL DOS INDÍCIOS - ALBERTO DE LACERDA - ASSÍRIO & ALVIM
sábado, 18 de junho de 2011
Poema - JOSÉ ALBERTO OLIVEIRA
Foi um acaso, uma obstinação? Encontrei-o
na rua, na praia? Os lábios do sol apenas
entreabertos. A areia quente, à volta do corpo.
Num bar, à tarde, bebemos cerveja.
Lagartos ao sol, maliciosos,
lambiam as pedras.
Língua rastejante, olhos súbitos. Esse
rapaz desprevenido, amei-o?
EM - TENTATIVA E ERRO - JOSÉ ALBERTO OLIVEIRA - ASSÍRIO & ALVIM
na rua, na praia? Os lábios do sol apenas
entreabertos. A areia quente, à volta do corpo.
Num bar, à tarde, bebemos cerveja.
Lagartos ao sol, maliciosos,
lambiam as pedras.
Língua rastejante, olhos súbitos. Esse
rapaz desprevenido, amei-o?
EM - TENTATIVA E ERRO - JOSÉ ALBERTO OLIVEIRA - ASSÍRIO & ALVIM
sexta-feira, 17 de junho de 2011
Recusa - JOÃO RUI DE SOUSA
De entontecer o toutiço
com o fervilhar deste agudo
destino em forma de ouriço
a querer varar-se no tudo
vou madrugando o caniço
vou afilando o canudo
de fustigar o enguiço
de resistir ao mergulho
- vou recusando este lixo
estes restos de monturo
(postos aqui em castigo
obrigatório e em tão duro
cheiro: o deste castiço
pestilento e assomadiço
dejectar atrás dum muro).
EM - LAVRA E POUSIO - JOÃO RUI DE SOUSA - DOM QUIXOTE
com o fervilhar deste agudo
destino em forma de ouriço
a querer varar-se no tudo
vou madrugando o caniço
vou afilando o canudo
de fustigar o enguiço
de resistir ao mergulho
- vou recusando este lixo
estes restos de monturo
(postos aqui em castigo
obrigatório e em tão duro
cheiro: o deste castiço
pestilento e assomadiço
dejectar atrás dum muro).
EM - LAVRA E POUSIO - JOÃO RUI DE SOUSA - DOM QUIXOTE
quinta-feira, 16 de junho de 2011
Amargura - LITA LISBOA
Vi um homem cabisbaixo
Sentado em pleno chão,
Seu rosto tão triste e magro!
A todos estendia a mão.
Fiquei a observar
O pobre homem a chorar
E a gente que ia avançando
E que nem um simples olhar,
Davam a quem tinha pranto!
Sinto uma enorme amargura,
Que nunca mais terá fim,
O egoísmo é tão grande,
A sociedade tão vil!...
Haverá algum porvir?...
Não sei como alguém consegue
Deitar na cama e dormir!
EM - FRAGMENTOS DE MIM - LITA LISBOA - TEMAS ORIGINAIS
Sentado em pleno chão,
Seu rosto tão triste e magro!
A todos estendia a mão.
Fiquei a observar
O pobre homem a chorar
E a gente que ia avançando
E que nem um simples olhar,
Davam a quem tinha pranto!
Sinto uma enorme amargura,
Que nunca mais terá fim,
O egoísmo é tão grande,
A sociedade tão vil!...
Haverá algum porvir?...
Não sei como alguém consegue
Deitar na cama e dormir!
EM - FRAGMENTOS DE MIM - LITA LISBOA - TEMAS ORIGINAIS
quarta-feira, 15 de junho de 2011
Prelúdio - DOMINGOS DA MOTA
Ressoam nas colinas do silêncio
as palavras paradas, por dizer:
sustidas, refreadas, frias, tensas
apetece libertá-las, a saber,
avivar a língua, silabá-las,
atear-lhes a voz, pô-las a arder,
despertar-lhes os sentidos - e afagá-las
comprazidas num corpo de mulher.
Apetece acolher, pegar em duas
ou três das palavras soltas, nuas
e com elas longamente conversar,
e manter a mais rouca, mais bravia
- prelúdio matinal da rebeldia -
sobre as dunas do tempo a galopar.
EM - BOLSA DE VALORES E OUTROS POEMAS - DOMINGOS DA MOTA - TEMAS ORIGINAIS
as palavras paradas, por dizer:
sustidas, refreadas, frias, tensas
apetece libertá-las, a saber,
avivar a língua, silabá-las,
atear-lhes a voz, pô-las a arder,
despertar-lhes os sentidos - e afagá-las
comprazidas num corpo de mulher.
Apetece acolher, pegar em duas
ou três das palavras soltas, nuas
e com elas longamente conversar,
e manter a mais rouca, mais bravia
- prelúdio matinal da rebeldia -
sobre as dunas do tempo a galopar.
EM - BOLSA DE VALORES E OUTROS POEMAS - DOMINGOS DA MOTA - TEMAS ORIGINAIS
terça-feira, 14 de junho de 2011
Opostos - EDGARDO XAVIER
Amamo-nos como iguais
No desalinho das auroras
Na sorte uivada da posse apetecida
Boca
Corpo
Sexo
Vida
E esta vontade de ser
No teu sangue
Só o fogo que me queima.
EM - CORPO DE ABRIGO - EDGARDO XAVIER - TEMAS ORIGINAIS
No desalinho das auroras
Na sorte uivada da posse apetecida
Boca
Corpo
Sexo
Vida
E esta vontade de ser
No teu sangue
Só o fogo que me queima.
EM - CORPO DE ABRIGO - EDGARDO XAVIER - TEMAS ORIGINAIS
segunda-feira, 13 de junho de 2011
Canção do verdadeiro abandono - NATÉRCIA FREIRE
Podem todos rir de mim,
Podem correr-me à pedrada,
Podem espreitar-me à janela
E ter a porta fechada.
Com palavras de ilusão
Não me convence ninguém.
Tudo o que guardo na mão
Não tem vislumbres de além.
Não sou irmã das estrelas,
Nem das pombas, nem dos astros.
Tenho uma dor consciente
De bicho que sofre as pedras
E se desloca de rastros.
EM - ANTOLOGIA POÉTICA - NATÉRCIA FREIRE - ASSÍRIO & ALVIM
Podem correr-me à pedrada,
Podem espreitar-me à janela
E ter a porta fechada.
Com palavras de ilusão
Não me convence ninguém.
Tudo o que guardo na mão
Não tem vislumbres de além.
Não sou irmã das estrelas,
Nem das pombas, nem dos astros.
Tenho uma dor consciente
De bicho que sofre as pedras
E se desloca de rastros.
EM - ANTOLOGIA POÉTICA - NATÉRCIA FREIRE - ASSÍRIO & ALVIM
domingo, 12 de junho de 2011
Vaidade - FLORBELA ESPANCA
Sonho que sou a Poetisa eleita,
Aquela que diz tudo e tudo sabe,
Que tem a inspiração pura e perfeita,
Que reúne num verso a imensidade!
Sonho que um verso meu tem claridade
Para encher todos o mundo! E que deleita
Mesmo aqueles que morrem de saudade!
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita!
Sonho que sou Alguém cá neste mundo...
Aquela de saber vasto e profundo,
Aos pés de quem a Terra anda curvada!
E quando mais no céu eu vou sonhando,
E quando mais no alto ando voando,
Acordo do meu sonho... E não sou nada!...
EM - SONETOS - FLORBELA ESPANCA - BERTRAND
Aquela que diz tudo e tudo sabe,
Que tem a inspiração pura e perfeita,
Que reúne num verso a imensidade!
Sonho que um verso meu tem claridade
Para encher todos o mundo! E que deleita
Mesmo aqueles que morrem de saudade!
Mesmo os de alma profunda e insatisfeita!
Sonho que sou Alguém cá neste mundo...
Aquela de saber vasto e profundo,
Aos pés de quem a Terra anda curvada!
E quando mais no céu eu vou sonhando,
E quando mais no alto ando voando,
Acordo do meu sonho... E não sou nada!...
EM - SONETOS - FLORBELA ESPANCA - BERTRAND
sábado, 11 de junho de 2011
Amor II - DOMINGOS MONTEIRO
A tua graça aérea, indefinida,
Graça de branco cisne, a agonizar,
Lembra a estrela da tarde adormecida
Na embaladora e doce voz do mar.
Como eu sofri... que angústia a despedida,
Nos meus olhos sem luz, do teu olhar,
Minha eterna sonâmbula, dorida
Dum sonho que a minha alma anda a penar.
Teu corpinho de lírio frouxo ao vento,
Teu porte de açucena desmaiada,
São o meu lindo e único tormento.
Curvo-me, ajoelho, ponho-me a rezar,
Madona dos meus sonhos adorada,
Uma oração d'amor a murmurar.
EM - POESIA - DOMINGOS MONTEIRO - INCM
Graça de branco cisne, a agonizar,
Lembra a estrela da tarde adormecida
Na embaladora e doce voz do mar.
Como eu sofri... que angústia a despedida,
Nos meus olhos sem luz, do teu olhar,
Minha eterna sonâmbula, dorida
Dum sonho que a minha alma anda a penar.
Teu corpinho de lírio frouxo ao vento,
Teu porte de açucena desmaiada,
São o meu lindo e único tormento.
Curvo-me, ajoelho, ponho-me a rezar,
Madona dos meus sonhos adorada,
Uma oração d'amor a murmurar.
EM - POESIA - DOMINGOS MONTEIRO - INCM
sexta-feira, 10 de junho de 2011
Os versos - JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA
Os versos assemelham-se a um corpo
quando cai
ao tentar de escuridão a escuridão
a sua sorte
nenhum poder ordena
em papel de prata essa dança inquieta
EM - BALDIOS - JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA - ASSÍRIO & ALVIM
quando cai
ao tentar de escuridão a escuridão
a sua sorte
nenhum poder ordena
em papel de prata essa dança inquieta
EM - BALDIOS - JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA - ASSÍRIO & ALVIM
quinta-feira, 9 de junho de 2011
Pegadas - ALBERTO DE LACERDA
Pegadas
As pegadas do coração
As pegadas
Agora indeléveis
No coração
EM - O PAJEM FORMIDÁVEL DOS INDÍCIOS - ALBERTO DE LACERDA - ASSÍRIO & ALVIM
As pegadas do coração
As pegadas
Agora indeléveis
No coração
EM - O PAJEM FORMIDÁVEL DOS INDÍCIOS - ALBERTO DE LACERDA - ASSÍRIO & ALVIM
quarta-feira, 8 de junho de 2011
O cheiro das raposas - JOSÉ ALBERTO OLIVEIRA
O chão era de cimento. Semeado de latas
de cerveja e embalagens perdidas, pacotes
de açúcar. Entraram os dois, a cara rapada,
o cabelo escuro, sobretudos negros.
O dia cheio de
folhas e nuvens. Andorinhas que voam baixo.
O mercador chegou com o carro repleto de
frascos coloridos e livros sobre os metais e a virtude
das terras. Acendo o cigarro breve do entardecer.
Levantou-se um súbito vento. Bóreas.
Transporta o cheiro a mato das raposas.
EM - TENTATIVA E ERRO - JOSÉ ALBERTO OLIVEIRA - ASSÍRIO & ALVIM
de cerveja e embalagens perdidas, pacotes
de açúcar. Entraram os dois, a cara rapada,
o cabelo escuro, sobretudos negros.
O dia cheio de
folhas e nuvens. Andorinhas que voam baixo.
O mercador chegou com o carro repleto de
frascos coloridos e livros sobre os metais e a virtude
das terras. Acendo o cigarro breve do entardecer.
Levantou-se um súbito vento. Bóreas.
Transporta o cheiro a mato das raposas.
EM - TENTATIVA E ERRO - JOSÉ ALBERTO OLIVEIRA - ASSÍRIO & ALVIM
terça-feira, 7 de junho de 2011
Brisa e braço - JOÃO RUI DE SOUSA
Apontava o rumo à brisa
apontava a brisa ao braço
juntava o braço e a vida
e nela apertava o laço
que às vezes era bulício
para noutras ser cansaço
e era braço do sumiço
ou a brisa do sargaço.
Ou era brisa só brisa
ou era braço em abraço
bem no rumor da pesquisa
bem longe do embaraço:
era o gosto da subida
à carne extrema da vida
ao alto cume do espaço.
EM - LAVRA E POUSIO - JOÃO RUI DE SOUSA - DOM QUIXOTE
apontava a brisa ao braço
juntava o braço e a vida
e nela apertava o laço
que às vezes era bulício
para noutras ser cansaço
e era braço do sumiço
ou a brisa do sargaço.
Ou era brisa só brisa
ou era braço em abraço
bem no rumor da pesquisa
bem longe do embaraço:
era o gosto da subida
à carne extrema da vida
ao alto cume do espaço.
EM - LAVRA E POUSIO - JOÃO RUI DE SOUSA - DOM QUIXOTE
segunda-feira, 6 de junho de 2011
Palavras - LITA LISBOA
Há palavras que nos vêm beijar...
Palavras de amor ou esperança,
Palavras de ternura e segurança,
Que é impossível esquecer ou rejeitar!
Solto-me de mim, e as recebo,
E dou também o que guardo no meu peito,
Com mãos estendidas e sorriso aberto,
E desfiamos segredos bem guardados,
Num anseio de harmonia sonhada.
E fico quieta, guardando a doce certeza
De que, afinal, não há ausências,
Há palavras, que ressoam como beijos!
EM - FRAGMENTOS DE MIM - LITA LISBOA - TEMAS ORIGINAIS
Palavras de amor ou esperança,
Palavras de ternura e segurança,
Que é impossível esquecer ou rejeitar!
Solto-me de mim, e as recebo,
E dou também o que guardo no meu peito,
Com mãos estendidas e sorriso aberto,
E desfiamos segredos bem guardados,
Num anseio de harmonia sonhada.
E fico quieta, guardando a doce certeza
De que, afinal, não há ausências,
Há palavras, que ressoam como beijos!
EM - FRAGMENTOS DE MIM - LITA LISBOA - TEMAS ORIGINAIS
domingo, 5 de junho de 2011
Introdução à filosofia - DOMINGOS DA MOTA
O que é um nome?, um rosto
levantado com o lume dos dias?
este lume que arde, arrefece,
nos consome, nos devora os ossos
taciturnos? O que é um nome
cinzelado a fogo?, esculpido
num rio de águas vivas?
da pulsão das águas ao tumulto
das veias dilatadas, abrasivas?
EM - BOLSA DE VALORES E OUTROS POEMAS - DOMINGOS DA MOTA - TEMAS ORIGINAIS
levantado com o lume dos dias?
este lume que arde, arrefece,
nos consome, nos devora os ossos
taciturnos? O que é um nome
cinzelado a fogo?, esculpido
num rio de águas vivas?
da pulsão das águas ao tumulto
das veias dilatadas, abrasivas?
EM - BOLSA DE VALORES E OUTROS POEMAS - DOMINGOS DA MOTA - TEMAS ORIGINAIS
sábado, 4 de junho de 2011
Chamamento - EDGARDO XAVIER
Sou a palavra certa na boca desejada
Soletrada
Sou teu chão
Tua razão
Tua estrada
Tua forma de inventar
E de tecer
Com nada
O universo
Na tua boca o meu nome ganha asas
Mas sou eu que voo ao teu encontro
EM - CORPO DE ABRIGO - EDGARDO XAVIER - TEMAS ORIGINAIS
Soletrada
Sou teu chão
Tua razão
Tua estrada
Tua forma de inventar
E de tecer
Com nada
O universo
Na tua boca o meu nome ganha asas
Mas sou eu que voo ao teu encontro
EM - CORPO DE ABRIGO - EDGARDO XAVIER - TEMAS ORIGINAIS
sexta-feira, 3 de junho de 2011
Meninas - NATÉRCIA FREIRE
As meninas são todas como eu:
A guardar astros que serão bordados,
A recolher os olhos deslumbrados
Depois duma viagem pelo Céu.
E vestem blusas para esperar a tarde
Que há-de surgir ao fundo da vereda
E crispam dedos de sonhar a seda
Que a tarde trouxe e na cantiga arde.
Fincam braços no chão do parapeito
E debruçam o corpo para a lua
E temem vultos negros pela rua
E sentem fogo a iluminar-lhes o peito.
E deitam-se nas camas encantadas
E olham luar correndo nas campinas
E são felizes porque são meninas
e porque a vida as vai fazer mudadas.
EM - ANTOLOGIA POÉTICA - NATÉRCIA FREIRE - ASSÍRIO & ALVIM
A guardar astros que serão bordados,
A recolher os olhos deslumbrados
Depois duma viagem pelo Céu.
E vestem blusas para esperar a tarde
Que há-de surgir ao fundo da vereda
E crispam dedos de sonhar a seda
Que a tarde trouxe e na cantiga arde.
Fincam braços no chão do parapeito
E debruçam o corpo para a lua
E temem vultos negros pela rua
E sentem fogo a iluminar-lhes o peito.
E deitam-se nas camas encantadas
E olham luar correndo nas campinas
E são felizes porque são meninas
e porque a vida as vai fazer mudadas.
EM - ANTOLOGIA POÉTICA - NATÉRCIA FREIRE - ASSÍRIO & ALVIM
quinta-feira, 2 de junho de 2011
Este livro - FLORBELA ESPANCA
Este livro é de mágoas. Desgraçados
Que no mundo passais, chorai ao lê-lo!
Somente a vossa dor de Torturados
Pode, talvez, senti-lo... e compreendê-lo.
Este livro é para vós. Abençoados
Os que o sentirem, sem ser bom nem belo!
Bíblia de tristes... Ó Desventurados,
Que a vossa imensa dor se acalme ao vê-lo!
Livro de Mágoas... Dores... Ansiedades!
Livro de Sombras... Névoas e Saudades!
Vai pelo mundo... (Trouxe-o no meu seio...)
Irmãos na Dor, os olhos rasos de água,
Chorai comigo a minha imensa mágoa,
Lendo o meu livro só de mágoas cheio!...
EM - SONETOS - FLORBELA ESPANCA - BERTRAND
Que no mundo passais, chorai ao lê-lo!
Somente a vossa dor de Torturados
Pode, talvez, senti-lo... e compreendê-lo.
Este livro é para vós. Abençoados
Os que o sentirem, sem ser bom nem belo!
Bíblia de tristes... Ó Desventurados,
Que a vossa imensa dor se acalme ao vê-lo!
Livro de Mágoas... Dores... Ansiedades!
Livro de Sombras... Névoas e Saudades!
Vai pelo mundo... (Trouxe-o no meu seio...)
Irmãos na Dor, os olhos rasos de água,
Chorai comigo a minha imensa mágoa,
Lendo o meu livro só de mágoas cheio!...
EM - SONETOS - FLORBELA ESPANCA - BERTRAND
quarta-feira, 1 de junho de 2011
Amor I - DOMINGOS MONTEIRO
Amei-te muito, amei-te tanto, tanto...
Como ninguém assim te amou, talvez.
Mais do que amara ainda um português,
Em horas de doçura e de quebranto.
Amei-te muito, amei-te tanto, tanto...
E tu bem sabes, meu amor, bem vês,
Como a minha alma lírica desfez,
Em halos d'oiro e mármore, este encanto.
Amei como amo; ainda mais aumenta,
Como um rumor longínquo de tormenta,
Esta afeição suprema e desvairada.
Tu és, amor, a estrela que me guia,
A minha eterna e santa aleluia,
Na noite do Infinito a madrugada.
EM - POESIA - DOMINGOS MONTEIRO - INCM
Como ninguém assim te amou, talvez.
Mais do que amara ainda um português,
Em horas de doçura e de quebranto.
Amei-te muito, amei-te tanto, tanto...
E tu bem sabes, meu amor, bem vês,
Como a minha alma lírica desfez,
Em halos d'oiro e mármore, este encanto.
Amei como amo; ainda mais aumenta,
Como um rumor longínquo de tormenta,
Esta afeição suprema e desvairada.
Tu és, amor, a estrela que me guia,
A minha eterna e santa aleluia,
Na noite do Infinito a madrugada.
EM - POESIA - DOMINGOS MONTEIRO - INCM
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