sexta-feira, 31 de julho de 2015

Incubadora - JORGE SOUSA BRAGA

Era tão pequena a mão      que
Nem o seu dedo mendinho

Conseguia agarrar. Pesava
Quinhentos gramas e respirava

Sem ajuda do ventilador
O coração da sua mãe quase

Que não batia      com receio de
Que ele sufocasse sob o peso

Do seu amor

EM - A FERIDA ABERTA - JORGE SOUSA BRAGA - ASSÍRIO & ALVIM    

quinta-feira, 30 de julho de 2015

Primavera - DAVID MARQUES

Chegou mais uma primavera;
A vegetação começou a desabrochar;
A terra rola como uma esfera;
As aves pavoneiam-se querendo acasalar.
A temperatura começa a aquecer;
Os raios solares têm mais intensidade
e depressa nos faz esquecer,
o rigoroso inverno e toda a sua pluviosidade.
Já se vê nos campos com satisfação,
as plantas empenhadas em florir,
cumprindo o seu ciclo da reprodução.
E com as suas múltiplas cores e aromas a fluir,
dá-nos uma tão agradável sensação
que, até sem vontade, nos faz sorrir.

EM - MENSAGEIRO DA ALMA - DAVID MARQUES - CHIADO EDITORA

quarta-feira, 29 de julho de 2015

O que é dito - MANUEL ANTÓNIO PINA

Alguma coisa em algum lugar
de o que existe e de o que não existe
é isto que escreve e a ciência de isto
a pura voz sem sujeito e o fora de ela.

Esta mão é um acontecimento improbabilíssimo
que o infinito e a eternidade atravessam,
alguma coisa fala de si própria através de ela.
De que pode ela falar senão de tudo?

O que está dentro e o que está fora
e vê e é visto de toda a parte
é o mesmo e o outro
e tudo isto é sabido em mim.

EM - POESIA REUNIDA - MANUEL ANTÓNIO PINA - ASSÍRIO & ALVIM

terça-feira, 28 de julho de 2015

Dorme meu filho* - MÁRIO CESARINY

Dorme meu filho
dezenas de mãos femininas trabalham
a atmosfera
onde os namorados pensam
cartazes simples
um por exemplo
minúsculo crustáceo denominado cíclope
por baixo da pele ou entre os músculos

Dorme meu filho
o amor
será
uma arma esquecida
um pano qualquer como um lenço
sobre o gelo das ruas

EM - PENA CAPITAL - MÁRIO CESARINY - ASSÍRIO & ALVIM

segunda-feira, 27 de julho de 2015

Apagamento - JOÃO RUI DE SOUSA

Em sua forma e sentido
perfila-se o chamamento
do que é regresso ao haurido
(ao tão escasso fardamento)

de ficar neste temido
remorso de um nunca assente
sentido para o vivido
como gesto ou pensamento.

É o marco repetido
sem cor ou só o cinzento
de quem foge ao alarido

no seu carro de indigente:
de quem passeia o castigo
em sina de apagamento.

EM - LAVRA E POUSIO - JOÃO RUI DE SOUSA - DOM QUIXOTE

domingo, 26 de julho de 2015

Silêncio - JOÃO MORGADO

Há o silêncio dos que se encontram
Há o silêncio dos que se afastam

Não, por favor, nada digas...

Se chegas, não preciso de palavras...
Se partes...
                  de que me servem as palavras?

EM - MARGINÁLIA - ANTOLOGIA - EDITA-ME

sábado, 25 de julho de 2015

Os girassóis - JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA

As paisagens alteram-se sem resolução
narrativas imortais desaparecem
e os girassóis assim
vulneráveis a desconhecidas ordens

Tu estás tão perto
mas sofro tanto
porque não vejo
como possa falar de ti
antre dois ou três séculos

EM - A NOITE ABRE MEUS OLHOS - JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA - ASSÍRIO & ALVIM

sexta-feira, 24 de julho de 2015

O gelo funde-se* - ALVARO GIESTA

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELO AUTOR

O gelo funde-se
entre o fumo e o fogo,

como o espanto se funde
com a sombra vinda da caverna

Cede lugar à palavra
que rasga com seu cântico a terra...

por entre as fendas
depois de arada
a seiva brota no reflexo das pedras;

assim se alimenta a sede de ser

O crânio
em ânsias de nascer estremece!

É o êxtase!

será lamento
se nesta frágua sem chão
se perder o verbo inteiro

EM - UM ARBUSTO NO OLHAR - ALVARO GIESTA - CALÇADA DAS LETRAS

quinta-feira, 23 de julho de 2015

Petição - RUY CINATTI

- Guarda-me a mim, disse o pescador
(de arrastão) ao despedir-se
de uma conversa entrecortada a medo,
em cada um sublinhando elos sagrados.

- Guarda-me a mim, guarda-me tu, irmão,
que me apertaste o antebraço com força
e leva-me contigo por mares bravios
onde arriscas a vida, a tua sofredora alma e brinca com ela
como se nos amássemos no mesmo chão, juntos.

EM - 56 POEMAS - RUY CINATTI - RELÓGIO D'ÁGUA

quarta-feira, 22 de julho de 2015

As palavras abrem portas - ANA HATHERLY

As palavras abrem portas
que só elas abrem-fecham:
revolvem o pó da lembrança
batem no vidro do coração
temporário Jonas prisioneiro

Engolidas pela máquina do tempo
um dia irão reaparecer
em mudos ecrãs iluminados

Hão-de ser recopiadas
mas sem poderem já recuperar
o acre sabor metafísico
da sua perdida voz

EM - O PAVÃO NEGRO - ANA HATHERLY - ASSÍRIO & ALVIM

terça-feira, 21 de julho de 2015

Aliança sobrenatural - ANTÓNIO MR MARTINS

Nos descaminhos da vida
onde pálida cor rosa
interfere-se perdida
no ensaio da prosa.

Se encobre na nuvem ar
em gasosos esperança,
pela pressa do céu galgar
como bem-aventurança.

Velha haste fiel rasto
pungente na memória,
conteúdo livro vasto.

No desencadear glória
entre humilde repasto,
definida dedicatória.

EM - MARGEM DO SER - ANTÓNIO MR MARTINS - TEMAS ORIGINAIS

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Nesse nunca - GASTÃO CRUZ

Nunca se pensa que virá um dia
em que essa idade como bruma fria
será a que teremos; todavia

nesse nunca está ela já contida:
se o pensamento desconhece a vida,
dela recebe o sangue da ferida

EM - ESCARPAS - GASTÃO CRUZ - ASSÍRIO & ALVIM

domingo, 19 de julho de 2015

Minha tão breve mãe - JOAQUIM PESSOA

Eu já morri     amiga     eu já morri
nas margens do meu tejo de amargura.
De tudo o que foi vivo e que eu vivi
ficou     feita de sal     esta lonjura.

Ó mãe! Raiz da força que eu quisera.
Minha tão breve mãe. Ó meu abraço!
Onde é que eu amanheço? Ah quem pudera
fazer comigo o que eu apenas faço.

Ai minha mãe de frios e basaltos.
Esta hora é de dor. De sobressaltos.
Vem cantar-me baixinho outra cantiga.

Vem dizer que é mentira. Que estou vivo.
Que não adormeci. Nem sou cativo.
Vem parir-me de novo querida amiga!

EM - 125 POEMAS - JOAQUIM PESSOA - LITEXA

sábado, 18 de julho de 2015

Do que me lembro - JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA

lembro-me da música dos lugares a oeste
dos planos para esse reino amado
que pretendemos tanto tomar de assalto
antes dos brados do fogo

Mas as minhas mãos traziam já
uma sina mais escura, nem a noite

Qualquer penumbra serviu
ao meu coração oculto
a miséria do inverno
o treino dos falcões nas escarpas
a glória iludida
em que se consumiu o tempo

EM - A NOITE ABRE MEUS OLHOS - JOSÉ TOLENTINO MENDONÇA - ASSÍRIO & ALVIM

sexta-feira, 17 de julho de 2015

4 haicu - CASIMIRO DE BRITO

160

Num vibrante músculo
me transformas. Tudo é simples
e azul. Bebo o mar

190

As tuas cuecas,
oh, deslizam pelas pernas!
meus dentes ajudam

195

Asa efusiva
teu corpo no meu plantado
a árvore da vida

271

Poderás dizer-me
como rolam as lágrimas?
- Bebe-as, saberás

EM - EROS MÍNIMO - CASIMIRO DE BRITO - LUA DE MARFIM

quinta-feira, 16 de julho de 2015

Almourol - VÍTOR CINTRA

Embora pouco mais do que rochedo,
Em ti se ergueram castros lusitanos,
Em tempos, levantados pelo medo
Não só dos animais, mas dos humanos.

Maciço de granito e arvoredo,
Que o Tejo, desde sempre, quis beijar,
Os povos te ocuparam, muito cedo,
Bem antes do romano cá chegar.

Ainda que, dalguns, não haja pista,
Terás sido ocupado por alanos,
Suevos, visigodos, muçulmanos.

Até que aconteceu a reconquista;
E dos castelos feitos por Templários,
Tornaste-te, Almourol, um dos lendários.

EM - NA SENDA DOS TEMPLÁRIOS - VÍTOR CINTRA - LUA DE MARFIM

quarta-feira, 15 de julho de 2015

Trinta dinheiros - MANUEL ALEGRE

No bengaleiro do mercado público
penduraram o coração.
Vestem o fato dos domingos fáceis.
Não têm rosto
têm sorrisos muitos sorrisos
aprendidos no espelho da própria podridão.
Têm palavras como sanguessugas.
Curvam-se muito.
As mãos parecem prostitutas.
Alma não têm. Penduraram a alma.
Por fora parecem homens.
Custam apenas trinta dinheiros.

EM - POESIA VOL. I - MANUEL ALEGRE - DOM QUIXOTE

terça-feira, 14 de julho de 2015

Insónia - MARIA AMÁLIA

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELA EDITORA

Pensamentos
Vibrações ocultas
Silêncio quebrado
Aurélia fugaz
Quando no interior
Se travam lutas
Quando à noite te chamo
Onde estás?
Onde estás sono meu?
Porque te ausentas
São pensamentos meus
Que te desviam?
São noites,
Muitas noites que te espiam
E dores, sim dores da alma...
Que sem querer
Te afugentam!

EM - MISTO DE SENTIMENTOS - MARIA AMÁLIA - EDIÇÕES OZ

segunda-feira, 13 de julho de 2015

Impunidade - VÍTOR CINTRA

Enquanto vão sentindo impunidade,
Embora cometendo tantos roubos,
Irão rir-se de toda a sociedade,
Tratando todo o povo como bobos.

Jamais irão parar co'a roubalheira,
Enquanto na "justiça" houver compadres.
Para os parar só há uma maneira,
A forca para eles e confrades.

Quem abre a porta a gente sem moral,
Ou é tacanho, ou é irracional.
Não há explicação a não ser essa.

Quem decidiu fazê-lo em Portugal,
Já tinha dos sabujos a promessa
De que ia enriquecer muito depressa.

EM - AO ACASO - VÍTOR CINTRA - LUA DE MARFIM

domingo, 12 de julho de 2015

Vocação para te amar - ÂNGEL MAGALHÃES

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELA EDITORA

Medos
segredos
sentimentos sufocantes
paixão escondida,
pecados absolutos
consumados
mãos trémulas
gritos roucos apuram os sentidos
mergulho no teu amor
esqueço todo o resto
não uso mais a palavra solidão
no meu dicionário foi apagada
gostar,
amar-te assim perdidamente
loucamente me sinto
viciada
nos teus braços me quero aconchegar
no teu calor me encontrar
quero-me vocação para te amar.

EM - PECADOS - NAS ASAS DO DESEJO - ÂNGEL MAGALHÃES - EDIÇÕES OZ

sábado, 11 de julho de 2015

Espreguiço-me - MARIETE LISBOA GUERRA

Abro a meia-janela da sala
E a lua aparece na sombra
Prata do jardim

Barrico o coração guerreiro
Fico na imobilidade de incesto
Com as asas de lama toldadas

Ele vem hoje,
Chegará todavia uma noite

Espreguiço-me na pausa entre as sílabas
Agita-se a dúvida no ar da noite

Esborracho as coxas que tremem
Dançam cheias de orvalho e pirilampos
Nesta ausência esperada alambuzo
Com parcimónia de chocolate

E outra vez a preguiça
Espreguiço-me
Como fazem as mulheres durante a noite

EM - UNIVERSO DAS PALAVRAS - COLECTÂNEA - SINAPIS

sexta-feira, 10 de julho de 2015

Qualquer dia, meu amor - JOSÉ ANTUNES

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELA AUTORA

Qualquer dia, alada mente
colho um ramo de estrelas e ventos
no jardim das luas, na fantasia petiz
e entre o sonho e a vida
vou brilhar o sol nas tuas mãos
e acordar-te com uma ternura
em cada dedo das mãos
... sem que nada me detenha
beijarei a doçura do teu amor
com deleite de me sentir no teu corpo!

EM - NUANCES DE UM SILÊNCIO A DOIS - ANA COELHO/JOSÉ ANTUNES - EDITA-ME

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Eis o momento* - ALVARO GIESTA

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELO AUTOR

Eis o momento
em que a poesia se faz carne:

a palavra
cai no espaço
em branco,

lavra
o vazio no silêncio
do papel,

rasga
o terreno fértil

A semente cai no novo espaço
e brota,

o cálamo rompe este novo espaço
antes tornado nada,

vazio...

nele
se lavrará a escritura

EM - UM ARBUSTO NO OLHAR - ALVARO GIESTA - CALÇADA DAS LETRAS

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Sem medo dos sonhos - VERA SOUSA SILVA

Querem-nos roubar o pão
e as sementes
para que não se plantem
mais esperanças
nem sonhos.

Roubam-nos o futuro
matando o presente,
criando o medo
e gemendo promessas vãs.

Ainda respiro Abril
ainda germino sonhos.

EM - ATÉ AMANHÃ - VERA SOUSA SILVA - LUA DE MARFIM

terça-feira, 7 de julho de 2015

Emoções - ALICE SANTOS

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELA AUTORA

Reconforto-me em palavras adormecidas,
Enxugo lágrimas escondidas.
Escondo um vazio no agreste do meu peito,
E sem jeito,
Deixo levar o meu pensamento
Sulcado de tristeza.
Entrego-me no pano branco de linho puro,
Procurando o afago que não chega.
E deixo-me cair numa tristeza profunda.
Teimam as lágrimas correr no meu rosto
Queimando do sal lacrimejante.
Escondo num sudário soluços de dor saudosos.
Cruel, escondida a emoção,
Do sentimento mais frio
Que me assola o espírito inquieto.
Sou como um títere
Embrulhada na trama da saudade.
Canto perene, num momento de solidão.

EM - FRUTOS VERMELHOS - ALICE S - EDIÇÕES VIEIRA DA SILVA

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Em cima dos rochedos... - GRAÇA PIRES

Em cima dos rochedos aprendi a observar
as migrações dos pássaros, a descobrir
pelas estrelas a direcção dos navios
e a entender os gritos das mulheres
caminhando loucas pela praia
quando pressentem a traição do mar.
As nuvens concentram-se no horizonte
como lágrimas em relevo
engrossadas pelo relento.
Dói-me nas mãos uma crueza
semelhante a uma emboscada.

EM - ESPAÇO LIVRE COM BARCOS - GRAÇA PIRES - POÉTICA EDIÇÕES

domingo, 5 de julho de 2015

A luz do teu rosto - ANA COELHO

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELA AUTORA

Quando o meu olhar
Toca os teus traços
A luz do teu rosto
Penetra em mim
Envolvo o meu sorriso

Voam no meu peito
Garças a planar
Em campos de lírios

Tacteio nas minhas veias
Correntes fluídas
Nos poros dilatados
Alegres arrepios
Que fazem de mim
O sol na foz da preia-mar

Ah!... Amor
Como sou feliz
Só por te olhar
Assim junto a mim...

EM - NUANCES DE UM SILÊNCIO A DOIS - ANA COELHO/ JOSÉ ANTUNES - EDITA-ME

sábado, 4 de julho de 2015

Poema clandestino - FRANCISCO VALVERDE ARSÉNIO

Tenho pressa em libertar este poema clandestino, sinto-o agitado neste silêncio profundo, neste hiato vazio, neste espaço sem som. Se os versos são reflexos de uma chama perene, as horas que se esvaem asfixiam-me a garganta e delimitam o alcance da minha voz. Sinto-me aprisionado neste limbo, sinto-me um corpo post mortem em que as sombras são lilases, em que o verbo subsiste na quietude. Este embuce silábico, é uma onda que não chega à praia, é uma faca que rasga as vestes, que despe o corpo e o cobre de palavras nuas, é como se a água deixasse de correr nos afluentes que alimentam o rio. Ausento-me... Ausento-me e permaneço neste êxtase estonteante, e as cores das letras perdem-se em vendavais dispersos na calada de um olhar. Tenho pressa em libertar este poema clandestino que trago fechado na palma das mãos.

EM - MARGINÁLIA - ANTOLOGIA - EDITA-ME

sexta-feira, 3 de julho de 2015

Que pena - DAVID MARQUES

Fazer as lágrimas nos teus olhos brotar...
Acredita, não era essa a minha intenção!
Te juro aos pés juntos e de coração,
apenas te queria um pouco alegrar.

Nem sempre o que nos vai na alma,
produz o efeito que é pretendido;
Espero que não te tenhas ofendido
por com indiscrição, invadir a tua calma.

Foi apenas um inocente acto de gratidão
pelo gosto que no meu poema postaste.
E, muito menos quis tocar o teu coração.

Agora que teu almoço já decorreu
e os teus lindos olhos já enxugaste
ficou acabrunhado também o meu.

EM - MENSAGEIRO DA ALMA - DAVID MARQUES - CHIADO EDITORA

quinta-feira, 2 de julho de 2015

O rio corre... - ALVARO GIESTA

LIVRO GENTILMENTE OFERECIDO PELO AUTOR

O rio corre...

como o embrião da sombra
esventra a noite,
assim neste correr
o rio desflora o ventre do seu leito

No seu correr devagar
desflora as escarpas
álgidas de luar,

banham-no
num afagar suave
as montanhas

pedregosas,
esventram-no
pelo seio dentro

Prenhe tem o ventre
dos segredos da montanha...

marulham nas águas
antes de os parir,
e no seu interior
se refugiam.

EM - UM ARBUSTO NO OLHAR - ALVARO GIESTA - CALÇADA DAS LETRAS

quarta-feira, 1 de julho de 2015

XV - VICTOR OLIVEIRA MATEUS

Este silêncio que à noite se infiltra como presença há muito esperada. Este silêncio que a brisa aconchega e pelos claustros sobrevoa o negrume da vida. É um bater de asas nas copas das árvores, uma doçura a escorrer pelas cornijas tão pelo tempo esbeiçadas e é também o reflexo da minha sede. Uma sede sem limites nem fim e onde uma ânsia de Amor me antecipa visões e êxtases. Este é o silêncio que sempre quis, aquele que à noite atravessa corredores e celas desenhando nas lajes as minhas Moradas - caminhos que nunca cedo, como se num antiquíssimo sonho uma nítida mão a mim me salvasse.

EM - NEGRO MARFIM - VICTOR OLIVEIRA MATEUS - LABIRINTO