quarta-feira, 31 de março de 2010
Quadras populares - VÁRIOS
Lá vai a lua saindo,
Redonda como uma bola,
Nela vai o meu amor
Tocando numa viola.
Não sei se rimamos bem,
Não sei se rimamos mal;
Teu peito é de sal e mel,
Meu peito é de mel e sal.
Toda a vida fui pastor,
Toda a vida guardei gado.
Trago uma nódoa no peito
De me agarrar ao cajado.
Coitadinho de quem dorme
À porta do seu amor.
Das pedras faz travesseiro
Do luar faz cobertor.
Cravos da minha janela
Não leva rapaz nenhum;
Falinhas, dou-as a todos,
Liberdades, só a um.
Ralha comigo o abade
Por cada vez que te vejo,
Os curas nunca souberam
A cura que faz um beijo.
Olhos negros roubadores,
Porque vos não confessais?
Das mortes que tendes feito,
Dos corações que roubais.
Minha sogra morreu ontem,
O Diabo vá com ela,
Deixou-me a chave da adega;
O vinho bebeu-o ela.
in... A lira do povo - Antologia - Terramar
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Todas as quadras aqui colocadas foram escolhidas aleatóriamente.
terça-feira, 30 de março de 2010
Com os outros - GASTÃO CRUZ
Com os outros nadaste, como eles
interrompeste a água com as mãos,
a dor desaparece ou é o frio que cessa?
A água rompe-se onde
foi o teu dia escasso,
estendes o corpo e mudas com os braços
o rumo, procurando
que te envolva de novo o frio
que perdias; feliz
tiveste algumas estações,
a região dos outros era a fria
paragem da alegria não porque dentro dela
suspendesses as mãos
mas porque parecias
desconhecer que o tempo se movia:
na verdade sabíamos
apenas começar, e os outros eram só
a dor do paraíso
in... Escarpas - GASTÃO CRUZ - Assírio & Alvim
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segunda-feira, 29 de março de 2010
Lágrima de preta - ANTÓNIO GEDEÃO
Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.
Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.
Olhei-a de um lado
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.
Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas,
em casos que tais.
Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:
nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo)
e cloreto de sódio.
in... Obra completa - ANTÓNIO GEDEÃO - Relógio D'Água
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domingo, 28 de março de 2010
25 de Abril de 74 - JOAQUIM MANUEL MAGALHÃES
"Apoderaram o Terreiro do Paço."
Na rádio, banda marcial,
fandango de uniforme
e comunicado.
"Uma rebelião."
Tropel no Rossio pegadiço.
Arraial a larga santaria
incompatível.
Enviesava a sublevação.
Pólvora de patentes e conjetura
difundia-se. Insenso complexo.
Pompa, vertigem.
in... Um toldo vermelho - JOAQUIM MANUEL MAGALHÃES - Relógio D'Água
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sábado, 27 de março de 2010
Outra coisa - MÁRIO CESARINY
Apresentar-te aos deuses e deixar-te
entre sombra de pedra e golpe de asa
exaltar-te perder-te desconfiar-te
seguir-te de helicóptero até casa
dizer-te que te amo amo amo
que por ti passo raias e fronteiras
que não me chamo mário que me chamo
uma coisa que tens nas algibeiras
lançar a bomba onde vens no retrato
de dez anos de anjinho nacional
e nove de colégio terceiro ano
pôr-te na posição sexual
tirar-te todo o bem e todo o mal
esquecer-me de ti como do gato
in... Pena capital - MÁRIO CESARINY - Assírio & Alvim
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sexta-feira, 26 de março de 2010
Soneto do soneto - MANUEL ALEGRE
Desata-se-me o verso no primeiro
no segundo de vento vai vestido
no terceiro de mar e marinheiro
no quarto está perdido está perdido
Recupero-o no quinto sem sentido
no sexto deito-o à sombra de um sobreiro.
No sétimo com Dante digo: «Guido
sê tu no oitavo verso o companheiro»
Porque não espero de voltar ao nono
leva-me O'Neill no décimo a um terceto
que aponte já no onze o sul e o sal.
Ao décimo segundo chega o sono.
No treze está a chave do soneto
mas nem sempre o catorze é o final.
in... Poesia vol II - MANUEL ALEGRE - Dom Quixote
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quinta-feira, 25 de março de 2010
Pied-de-nez - MÁRIO DE SÁ-CARNEIRO
Lá anda a minha Dor às cambalhotas
No salão de vermelho atapetado -
Meu cetm de ternura engordurado,
Rendas da minha ânsia todas rotas...
O Erro sempre a rir-me em destrambelho -
Falso mistério, mas que não se abrange...
De antigo armário que agoirento range,
Minha alma actual o esverdinhado espelho...
Chora em mim um palhaço às piruetas;
O meu castelo em Espanha, ei-lo vendido -
E, entretanto, foram de violetas,
Deram-me beijos sem os ter pedido...
Mas como sempre, ao fim - bandeiras pretas,
Tômbolas falsas, carrossel partido...
in... Poesias - MÁRIO DE SÁ-CARNEIRO
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quarta-feira, 24 de março de 2010
Perseverança - MIGUEL TORGA
Abro o leque da sorte, e mostro o jogo,
Outro lance perdido!
Obras do mundo que eu não tenha erguido
Sobre o suor do corpo e da vontade,
Morrem-me assim nas mãos, num dolorido
Gesto de orgulho e de incapacidade.
Mas o fruto humilhante da falência
Tem um azedo gosto que me excita.
Se o destino se engana, ou se dormita
Na hora crucial do desafio,
Então é o mar que há-de encontrar no rio
O sal da terra em que não acredita.
in... Poesia completa vol I - MIGUEL TORGA - Dom Quixote
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terça-feira, 23 de março de 2010
Lúbrica... - CESÁRIO VERDE
Mandaste-me dizer,
No teu bilhete ardente,
Que hás-de por mim morrer,
Morrer muito contente.
Lançaste no papel
As mais lascivas frases;
A carta era um painel
De cenas de rapazes!
Ó cálida mulher,
Teus dedos delicados
Traçaram do prazer
Os quadros depravados!
Contudo, um teu olhar
É muito mais fogoso
Que a febre episolar
Do teu bilhete ansioso:
Do teu rostinho oval
Os olhos tão nefandos
Traduzem menos mal
Os vícios execrandos.
Teus olhos sensuais,
Libidinosa Marta,
Teus olhos dizem mais
Que a tua própria carta.
As grandes comoções
Tu neles sempre espelhas;
São lúbricas paixões
As vívidas centelhas...
Teus olhos imorais,
Mulher, que me dissecas,
Teus olhos dizem mais
Que muitas bibliotecas!
in... Obra completa - CESÁRIO VERDE - Livros Horizonte
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segunda-feira, 22 de março de 2010
À memória de Ulina - MANUEL MARIA BARBOSA DU BOCAGE
Sonho, ou velo? Que imagem luminosa,
Esclarecendo o manto à noite escura,
A meus olhos pasmados se afigura,
Sopeia a tua dor, alma saudosa!
De mais vistoso objecto o céu não goza,
A clareza do sol não é mais pura...
Que encanto! Que esplendor! Que formosura!
Caiu-te um astro, abóbada lustrosa!...
Sorrisos da purpúrea madrugada,
Vós tão gratos não sois... Ah! Como inclina
A face para mim branda, apiedada!
Refulgente visão, tu és de Ulina;
Tu és cópia fiel da minha amada,
Ou reflexo talvez da luz divina.
in... Antologia poética - BOCAGE - Verbo
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domingo, 21 de março de 2010
Estendo estes ramos...* - ANTÓNIO RAMOS ROSA
Estendo estes ramos de nocturnas matérias
sobre um corpo repousado em suas sombras
Sabe a madeira a vinho e pedra
e a frutos de água e sombra numa espessa lentidão
Beijo o umbigo o olho de uma árvore
e as colinas do peito suavemente incendiadas
e a sua boca esse bosque com suas matérias movediças
Desço até ao sexo sorvo os anéis amarelos
do seu musgo menstrual É uma folha ardente
uma pedra do mar uma lua de outono
maranha incandescente de sílabas marinhas
in...Delta seguido de Pela primeira vez - ANTÓNIO RAMOS ROSA- Quetzal
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* Os poemas deste livro não são titulados. Usei parte do primeiro verso como titulo por questões logísticas.
sábado, 20 de março de 2010
Maria Lisboa - DAVID MOURÃO FERREIRA
É varina, usa chinela,
tem movimentos de gata.
Na canastra, a caravela;
no coração, a fragata.
Em vez de corvos, no xaile
gaivotas vêm pousar.
Quando o vento a leva ao baile,
baila no baile co'o mar.
É de conchas o vestido;
tem algas na cabeleira;
e nas veias o latido
do motor de uma traineira.
Vende sonho e maresia,
tempestades apregoa.
Seu nome próprio, Maria.
Seu apelido, Lisboa
in... Obra poética - DAVID MOURÃO FERREIRA - Editorial Presença
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sexta-feira, 19 de março de 2010
Fui... o que já não sou!... - PAULO THEMUDO
Cego de vento
Rasgado no sal do mar
Estilhaçado o sentimento de vida
Atento ao céu, não vi nada.
Já não corre sangue
Já não corre nada.
Nada do que eu queria...
Para trás o vazio,
Agora, sou vida!
in... Fui... o que já não sou!... - PAULO THEMUDO - Edium Editores
quinta-feira, 18 de março de 2010
Estilhaços - MANUELA SANTOS
Junto os estilhaços da dor
ainda quente
e recordo
a desordem das palavras
ainda a roçarem os sentidos...
esmagadas
penetram-me as entranhas acesas
e o triunfo da desilusão
inexorável
esboroa toda a esperança
acarinhada em ti.
in... De luz e de sombra - Antologia poética - Papiro
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quarta-feira, 17 de março de 2010
Abril de Abril - MANUEL ALEGRE
Era um Abril de amigo Abril de trigo
Abril de trevo e trégua e vinho e húmus
Abril de novos ritmos novos rumos.
Era um Abril comigo Abril contigo
ainda só ardor e sem ardil
Abril sem adjectivo Abril de Abril.
Era um Abril na praça Abril de massas
era um Abril na rua Abril a rodos
Abril de sol que nasce para todos.
Abril de vinho e sonho em nossas taças
era um Abril de clava Abril de acto
em mil novecentos e setenta e quatro.
Era um Abril viril Abril tão bravo
Abril de boca a abrir-se Abril palavra
esse Abril em que Abril se libertava.
Era um Abril de clava Abril de cravo
Abril de mão na mão e sem fantasmas
esse Abril em que Abril floriu nas armas.
in... Poesia vol I - MANUEL ALEGRE - Dom Quixote
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terça-feira, 16 de março de 2010
Poeta castrado, não! - JOSÉ CARLOS ARY DOS SANTOS
Serei tudo o que disserem
por inveja ou negação:
cabeçudo drumedário
fogueira de exibição
teorema corolário
poema de mão em mão
lãnzudo publicitário
malabarista cabrão.
Serei tudo o que disserem:
Poeta castrado não!
Os que entendem como eu
as linhas com que me escrevo
reconhecem o que é meu
em tudo quanto lhes devo:
ternura como já disse
sempre que faço um poema;
saudade que se partisse
me alagaria de pena;
e também de alegria
uma coragem serena
em renegar a poesia
quando ela nos envenena.
Os que entendem como eu
a força que tem um verso
reconhecem o que é seu
quando lhes mostro o reverso:
Da fome já não se fala
- é tão vulgar que nos cansa -
mas que dizer de uma bala
num esqueleto de criança?
Do frio não reza a história
- a morte é branda e letal -
mas que dizer da memória
de uma bomba de napalm?
E o resto que pode ser
o poema dia a dia?
- Um bisturi a crescer
nas coxas de uma judia;
um filho que vai nascer
parido por asfixia?!
- Ah não me venham dizer
que é fonética a poesia!
Serei tudo o que disserem
por temor ou negação:
Demagogo mau profeta
falso médico ladrão
prostituta proxeneta
espoleta televisão.
Serei tudo o que disserem:
Poeta castrado não!
in... Obra poética - JOSÉ CARLOS ARY DOS SANTOS - Edições Avante
segunda-feira, 15 de março de 2010
Depois das cores do arco-íris - MARIA HELENA VENTURA
Com o perfil das lâmpadas
desenhado na calçada
embalo este soluço irreprimível
Transbordas de uma lua pequenina
a separar os seios
entre anéis de estrelas
semeadas no azul da noite
Guardo-te sob a língua
como o remédio para o coração
Não dói a dor
só arde um pouco
como a morte esperada
na quietude fosforescente dos destroços
in... Intertexto submerso - MARIA HELENA VENTURA - Editorial Escritor
domingo, 14 de março de 2010
Terra humana - MIGUEL TORGA
É inútil desistir.
Por detrás das muralhas da vontade
Mora o desejo, a força que as derruba.
Deixa que nasça, que avolume e suba
Esta maré de seiva e de ternura!
A grandeza do homem, criatura
Que cresce enquanto ama e pode amar,
É saber
Que só depois do gosto de pecar
Lhe vem o gosto de se arrepender.
in... Poesia completa vol. II- MIGUEL TORGA - Dom Quixote
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sábado, 13 de março de 2010
Amor provocante - JOSÉ MANUEL BRAZÃO
Foto retirada do blogue do autor
Este amor
não me deixa sereno.
É provocante!
Mal acordo
avisa-me da minha agenda.
Tantos utentes
e alguns pacientes.
Que fazer?
A uns digo
as palavras do costume,
as que alimentam o seu ego!
A outros
é mais complicado.
Aquela mente
anda tão doente,
e têm o corpo
com tantas dores,
que nem eu
lhes receito amores!
Antes
amor provocante
do que amor doentio...
in... http://poesiacomemocoes.blogspot.com/ - JOSÉ MANUEL BRAZÃO
Blogue do autor aqui.
Existem poetas que mesmo não tendo livros editados merecem destaque neste espaço
sexta-feira, 12 de março de 2010
Repuxo - CRISTINO CORTES
Contra a gravidade o esforço projectado
E o único direi inútil resultado
À volta ficando o chão todo molhado
E em tudo assim parece este aquático fluxo
Teimosia e gratuita perseverança;
Não chega lá acima mas não desiste
Surdo à matéria o repuxo persiste
O passageiro o vê e há um que interroga
Para quê tanta água deitada fora?!
Baldado está o risco do arquitecto
Circular como o voo de tanto insecto;
E se o líquido circula em circuito roto
O gajo é palerma e não é pouco
Contra a gravidade o esforço projectado
in...Poemas de amor e melodia - CRISTINO CORTES - Papiro editora
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quinta-feira, 11 de março de 2010
Castelo de Monte-Mayor - XAVIER ZARCO
Menção honrosa (poesia) Prémio literário Afonso Duarte - 2003/04
Acordai,
pedras,
que vos chamo.
Dizei-me
dos segredos e sonhos
das mãos que vos ergueram.
Dessa alta mirada,
de onde olhais para a lonjura,
falai-me
do curvado povo
nos arrozais,
do sereno
ofício do sol,
das lendas
que o Tempo
em seu lento caminhar,
em vós guardou.
Acordai,
pedras,
que em breve partirei.
Levar-vos-ei comigo
como quem leva um verso
ou uma ave
no olhar.
in... Monte Maior sobre o Mondego - XAVIER ZARCO - Temas Originais
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quarta-feira, 10 de março de 2010
Ao fundo o cemitério de Benfica - ANTÓNIO BORGES COELHO
Madrugada
mancha de terra negra
que o arado revolveu
e uma faixa de terra encarnada
Já na linha terra céu
que o cemitério alcança
vi passar entre a névoa
com os varais tortos
os cipestres com as suas lanças
a almejada carroça dos mortos
Gritei brutal
enterrando os pés
na terra vermelha matinal
chorando de raiva e de troça
vem vem depressa
ó desgraçada carroça
in... Ao rés da terra - ANTÓNIO BORGES COELHO - Caminho
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terça-feira, 9 de março de 2010
Esvaziando o cálice existe um tambor* - AMÉLIA VIEIRA
Esvaziando o cálice existe um tambor.
Esvaziando o amor existe nada.
Esvaziando o tempo existe um vácuo.
Esvaziando o espaço um outro mais fechado.
Esvaziando quem por força se mantém, ficando suspenso sobre o nada, resta a ordem invertida para ser da renúncia um marco na corrente.
- nova alvorada - !
Esvaziando tudo, tirando tudo, não querer mais nada... eis a chegada!
in...Revelações solares - AMÉLIA VIEIRA - Vega
* Os poemas deste livro não são titulados. Usei o primeiro verso como titulo por uma questão logistica.
Este livro pode ser adquirido na livraria POESIA INCOMPLETA
segunda-feira, 8 de março de 2010
Cruel e desigual - SANDRA NÓBREGA (FLY)
Se soubesses
O quanto me quebra a tua ausência
O quanto dói a saudade
O quanto me sinto em falência
Por esta dura realidade
Impossível de gerir
Este vil sentimento
Tão amargo este sentir
Desta dor, a todo o momento
Foi imposta a distância
Que separa a vida da morte
Sem Ti não há bonança
E eu, sinto, que perdi o norte
Passa o tempo, languidamente
Somam-se os dias que passo sem Ti
A Saudade cresce e desesperadamente
Desejo tanto ter-te aqui!!!
Viver sem Ti, Mãe Querida
É guerra muda, fria e quase-fatal
Teima em sangrar esta ferida
Deste sentimento, tão cruel e desigual
in... Pedaços d'alma - SANDRA NÓBREGA - Temas Originais
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domingo, 7 de março de 2010
Alegoria - JOÃO LOPES
Releio Sócrates e Platão
Esquecidos na poeira da cave.
Acompanha-me a tristeza do cão
Que me ajudava a pensar
Pensamentos de outras memórias.
Face ao rosto da transcendência
Pensava com ele a hipótese
De acrescentar silêncio à música.
Refaço no preto e branco
Dos livros dos antepassados
A utopia magoada dos avós
Fúria de amantes anónimos
Escravizados pelo clarão
Entretanto é a medida do tempo.
in... Poemas de guerra - JOÃO LOPES - Gótica
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sábado, 6 de março de 2010
Soneto - ALEXANDRE O'NEILL
Tempo das cerejeiras agressivas
A avançar pelo meu quarto dentro.
Velho tempo das noites explosivas
Em que o sangue crescia como o vento!
Tempo - aproximação das coisas vivas,
Do teu hálito doce, violento.
Tempo - horas e horas convertidas
No ouro raro e inútil dum lamento...
Tempo como uma ferida no meu lado,
Coração palpitando sobre a lama.
Tempo perdido, sangue derramado,
Resto de amor que se deixou na cama,
Horizonte de guerra atravessado
Pelo corpo audacioso duma chama.
in... Poesias completas - ALEXANDRE O'NEILL - Assírio & Alvim
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sexta-feira, 5 de março de 2010
2003 12 10* - JORGE FAZENDA LOURENÇO
Ave, musa sem rebuço.
Dize lá, poeta rebuçado.
Agora que a luta de classes acabou
Graças à benevolência de sua excelência,
Ó musa, voltaremos a ser realistas
Sem medo que as abóboras meninas
Virem princesas pequeno-burguesas.
Sim, o dia está que não se pode,
Cinza d'água, a cor dos afligidos
Pela dor menor, interna, pingue-pingue
Amolecendo meloso as almas.
Lisboa é uma rua de sol nos entresseios do caos.
Ena, ena, o poeta abrunhou.
in... Cutucando a musa - JORGE FAZENDO LOURENÇO - Relógio D'Água
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* Os poemas deste livro não são titulados mas sim datados.
quinta-feira, 4 de março de 2010
Mulher - JORGE SOUSA BRAGA
Metade mulher metade pássaro
Metade anémona metade névoa
Metade água metade mágoa
Metade silêncio metade búzio
Metade manhã metade fogo
Metade jade metade tarde
Metade mulher metade sonho
in... A ferida aberta - JORGE SOUSA BRAGA - Assírio & Alvim
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quarta-feira, 3 de março de 2010
Fotografia - GONÇALO LOBO PINHEIRO
A imagem ficou retida
Na película da eternidade.
Disparei ao tentar agarrar o infinito.
Sei que se estiveres no enquadramento,
Serás minha em lembrança de papel.
No foco tornei claro o teu rosto,
No diafragma regulei a tua luz.
Perdi sensibilidades par te poder dar recorte, e
Orientei as linhas para te percorrer.
Escolhi esta fotografia!
De olhar para ela vi magia,
Sossego, calma, traduz sem fim,
A invertida imagem da tua alma.
Olha bem para esta fotografia.
É tua, minha e de mais ninguém.
in...Etéreo - GONÇALO LOBO PINHEIRO - Temas Originais
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terça-feira, 2 de março de 2010
VIII* - JOÃO MIGUEL FERNANDES JORGE**
No mar os barcos pescadores,
longe de mim e de ti, viu-os a nossa vida
navegar
as ondas, agora em pensamento,
o vento áspero traz a névoa salina
o verso escrito na mesa de azulejo negro
a paisagem subitamente mudou
separou-se da hora e do lugar separou-se da terra e do mar
se vai o tempo
se estende o espaço
nem tu podes sequer ajudar-me
in... Mãe-de-fogo - JOÃO MIGUEL FERNANDES JORGE** - Relógio D'Água
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*Os poemas deste livro são numerados com caracteres romanos
** Este livro contém desenhos de JOÃO CRUZ ROSA
segunda-feira, 1 de março de 2010
7* - GONÇALO LOBO PINHEIRO
Não serei o mesmo ingénuo.
Inferir em ti, seria,
Agora, infrutífero.
Capturar a tua alma
Não está nos meus desígnios.
Ah! Como desejarias
Que vestisse o meu hábito
E atendesse às tuas preces.
Não! Chega de lamento.
Desta vez não irei ao casino.
Não será a roleta a desenhar o meu destino.
Não serás a dama do meu jogo.
Não te pedirei para dançar.
in... Não existes (ou o breve manual prático de como esquecer um amor antigo) - GONÇALO LOBO PINHEIRO - Temas Originais
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* Os poemas deste livro são numerados em vez de titulados.
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